sexta-feira, 17 de dezembro de 2021

Arquitetos/UFRGS 1958 – 63 anos

    A nossa turma de Arquitetos de 1958 da Faculdade de Arquitetura da UFRGS completa 63 anos de formatura nesta sexta-feira (17.12.2021). A colação de grau foi realizada no Salão de Atos da UFRGS. No dia da formatura, a turma posou  para a foto com o Paraninfo na escadaria da Faculdade de Arquitetura.

    Iniciamos o curso em março de 1954, quando havia menos de dois anos que fora criada a Faculdade de Arquitetura. 

    Em decorrência da forte mobilização estudantil, o Decreto Federal número 30.944, de 19 de junho de 1952, unificou os dois cursos então existentes que formavam Arquitetos, um na Escola de Engenharia e outro no Instituto de Belas Artes, ambos da mesma universidade. 

Ao fundo, atrás das árvores, o antigo prédio da
Faculdade de Arquitetura da UFRGS.

   O concurso vestibular da nossa turma e quase todo o curso foram realizados em uma edificação acanhada e inadequada entre o Observatório Astronômico e a Escola de Engenharia, ambos da UFRGS, em frente à Praça da Argentina. 

Só o último ano foi cursado no novo prédio, na Rua Sarmento Leite esqina Av. Osvaldo

Presidente Juscelino Kubitschek inaugura, em jan./1958
Aranha, inaugurado em janeiro de 1958 pelo presidente Juscelino Kubitschek (foto). O autor do projeto de Arquitetura foi o Arquiteto Fernando Petersen Lunardi, docente da Faculdade (foto abaixo).

 

O paraninfo escolhido foi o arquiteto Rino Levi, então professor da Faculdade de

Arquiteto Rino Levi
Arquitetura e Urbanismo da USP.  Ele participou da criação do Instituto de Arquitetos do Brasil, onde foi membro atuante por toda a vida, participando, inclusive, do projeto de construção do edifício-sede da seção paulista, que presidiu em 1952. Levi também foi expoente da Arquitetura Moderna no Brasil e um dos responsáveis pela transformação da arquitetura da cidade de São Paulo.

Entre suas principais obras estão o Cine Art-Palácio Recife (1936), Instituto Sedes Sapientiae (1940), Cine Ipiranga (1941), Teatro Cultura Artística (1942), Edifício Prudência (1944), Hospital do Câncer (1947), Edifício Seguradora Brasileira (1948), Hospital Albert Einstein (1958) e o Centro Cívico (1965), atual Paço Municipal de Santo André. 

Os professores homenageados foram o artista visual Ângelo Guido, os arquitetos Demétrio Ribeiro, Edgar Graeff, Emil Bered, Enilda Ribeiro e Manoel Meira, além dos engenheiros Ivo Wolff, Paulo Gomes de Freitas e Urano Eichenberg.

Em 1º de dezembro de 1958, a turma ofereceu um jantar ao paraninfo e aos professores homenageados, no Recreio Avenida, um restaurante que havia no Quarto Distrito, muito apreciado pela excelência do serviço. Participaram todos os homenageados e 31 formandos, inclusive eu, à direita, em frente ao ventilador.

Entre 36 colegas, os mais próximos eram João Paulo Umpierre Pohlmann, Fernando Gonzalez, Hugolino Pra, Nei Mário Carneiro, Sylvia Lewgoy, Gina Raffin, Pedro Simch e Edgar do Valle.

Mantenho até hoje contatos com o amigo e colega João Paulo Pohlmann e com o apreciado Prof. Emil Bered.

domingo, 19 de setembro de 2021

Franz Karl Brenner – 190 anos

 É tempo de lembrar meu bisavô materno, nos 190 anos de seu nascimento.

Franz Karl Brenner nasceu em 17 de setembro de 1831, em Ellweiler, pequena aldeia do Principado de Birkenfeld. Era filho do estalajadeiro Johann Michael Brenner e Maria Dorothea Barth Brenner, natural

de Sötern, 10 km a oeste.

O Principado de Birkenfeld era um território de 503 km2, na região do Hunsrück, um enclave na Província Prussiana do Reno, mas não pertencente a ela. E assim foi mantido até a unificação da Alemanha, em 1871. Em 1817, após o Congresso de Viena (1814-15), que redesenhara o mapa político europeu, depois da derrota da França napoleônica, o Principado passara a pertencer ao Grão-Ducado de Oldenburg.

Ellweiler fica 8 km ao sul de Birkenfeld, cidade sede do Principado e origem da família Brenner da minha linha linha paterna. Teria havido um ancestral comum, o ferreiro Johannes Nikolaus Brenner, nascido em Brücken, em 1657, mas ambas as famílias Brenner não poderiam se considerar parentes. Tal distanciamento na consanguinidade era muito mais acentuado entre meus pais, por isso minha irmã Maria Helena e eu fomos registrados com o duplo sobrenome Brenner de Brenner. 

Além das localidades citadas no texto, o mapa mostra Abentheuer, a oeste, local onde viveu o mais antigo ancestral Brenner que conhecemos. Em 1540, o vilarejo se chamava Leyen, onde a família de Hans Brenner, chamado "der Alte von der Leyen" -- o velho de Leyen --, tinha quatro casas, um moinho e uma serraria movidos a roda d'água.

Emigração - Profissão

Franz Karl Brenner era um adolescente quando emigrou para o Brasil, em 1846, na companhia da família de sua irmã Katharina, 25 anos, casada com Johann Jakob Cullmann e suas três crianças. 

Franz Karl acompanhou por cerca de dois anos a família de sua irmã que se estabeleceu na Colônia Alemã de São Leopoldo. Aos 18 anos mudou-se para Porto Alegre, onde aprendeu o ofício da alfaiataria, residindo na Rua da Praia nº 285, provavelmente na casa de seu mestre alfaiate, como costumavam fazer os aprendizes. Em 1858, com 27 anos, estabeleceu-se em Santa Maria, onde passou a ser chamado Carlos Brenner. Três anos depois, casou com a santa-mariense Christiana Hoffmeister, filha do imigrante Mathias Hofmeister.

Carlos Brenner prosperou com sua alfaiataria e como comerciante, na Rua do Comércio, atual Doutor Bozano. O casal teve 13 filhos, dois dos quais faleceram pouco depois do nascimento. Sua condição financeira possibilitou-lhe enviar seu primogênito para estudar na Alemanha. Ildefonso Brenner, meu avô materno, durante quatro anos estudou na famosa Europäischen Moden-Akademie, Academia Européia de Moda, em Dresden. Os alunos aprendiam contabilidade, aritmética, letras, estilística, idiomas etc. e principalmente método de corte e feitio. Passavam por um treinamento técnico e científico para poder assumir mais tarde a liderança de um negócio maior. Às margens do Rio Elba e cercada pela floresta de Heide, Dresden é conhecida como "a Florença do Elba" devido à harmonia de sua beleza natural com sua belíssima Arquitetura. No final da 2ª Grande Guerra, a cidade, que não tinha alvos militares, foi cruelmente destruída pelos bombardeios Aliados. 

Religião

Carlos Brenner era luterano, assim como também tinham sido os pais de Christiana. Entretanto, ela e seus irmãos haviam sido batizados na Igreja Católica, porque em Santa Maria não havia a Igreja de seus antepassados e eram raras as visitas de pastores itinerantes. A Igreja Luterana-Evangélica de Santa Maria só seria fundada cinco anos após o casamento de Carlos e Christiana, celebrado 10.9.1861 na primitiva igrejinha católica de Santa Maria onde hoje está o monumento ao Cel. Niederauer.

Mas Carlos Brenner estava entre os fundadores da Deutsche Evangelische Gemeinde de Santa Maria da Boca do Monte, a Comunidade Evangélica Alemã, fundada em 8 de abril de 1866. Sua tradição familiar, sua cultura e sua fé religiosa – pois trouxera da Alemanha sua Bíblia luterana, que conservou até sua morte – o mantiveram ligado à religião de seus antepassados. Durante seu curto período em São Leopoldo e, depois, nos nove anos em que vivera em Porto Alegre, Carlos dispusera dos ofícios de sua religião.

A história oral conta que, nas manhãs de domingo, Carlos e Christiana saíam juntos de sua casa na Rua do Comércio, mas tomavam rumos diferentes: Ele ia ao culto na igreja luterana, na Praça da República (atual “dos Bombeiros”), enquanto ela se dirigia à matriz católica na Capela do Divino, na Av. Rio Branco, esquina Rua dos Andradas.

Filhos

O casal teve 13 filhos, dois dos quais faleceram pouco depois do nascimento.

Ildefonso ê13.06.1862  10.04.1951

Germano ê 8.1.1864  20.3.1928

Etelvina Veronica ê 4.2.1866  - 7.5.1957

Júlio ê 24.2.1868   -     12.02.1939

Isabel ê11.11.1869    5.4.1898 (c/ 28 anos e 6 meses).

Percival ê15.2.1871  24.8.1949

Alfredo ê23.5.1874  28.2.1935

Fructuosoê18.9.1876 Santa Maria  

Albino ê15.2.1879   24.3.1879 (c/40 dias)

Adelma ê 8.3.1880 22.9.1960

Alice ê14.9.1882 14.9.1918 (no dia em que completava 36 anos)

  • José  ê18.4.1885  20.4.1885 Santa Maria  (c/2 dias)

    Oscar ê14.9.1886 

      

    Carlos Brenner faleceu com 73 anos de idade, em 18.10.1904, e sua viúva Christiana lhe sobreviveu apenas 19 horas. Ela já sofria de grave doença e não suportou a perda do marido, morrendo no dia seguinte, com 60 anos de idade.

    À direita, o necrológio publicado na 1ª página do jornal santa-mariense O Combatente, em 23.10.1904, obtido na hemeroteca digital da Casa de Memória Edmundo Cardoso, em Santa Maria.


      Mausoléu 

      sábado, 7 de agosto de 2021

      Mais que centenários (1)

      Quem vive na mesma casa desde que nasceu, convive com objetos que pertenceram aos seus bisavós, avós e pais, por isso muito ligados à história da família. É o meu caso. Aqui nasci há 87 anos, na casa construída por meu bisavô materno, Jacob Ludwig Laydner, em 1853, na então Rua do Comércio, atual 2ª Quadra da Rua Dr. Bozano, nº 1065. Vivi em outros lugares somente nos cinco anos quando estudante no Curso de Arquitetura da UFRGS, em Porto Alegre.

      Presente de casamento

      Inicio esta série de postagens com um conjunto de taças de cristal Baccarat. Não são os objetos mais antigos na casa, mas são mais que centenários. O jogo de taças foi um presente de casamento recebido por meus avós maternos Ildefonso Brenner e Lydia Laydner Brenner, em 7 de maio de 1902, há 119 anos. O casamento, celebrado nesta mesma casa, foi noticiado por O Combatente, antigo jornal de Santa Maria, em 8.5.1902: 



      Ildefonso era comerciante, e faltavam 37 dias para ele completar 40 anos. Lydia tinha 28 anos e era a filha mais jovem dos donos da casa, o ourives alemão Jacob Ludwig Laydner e sua esposa Maria Luiza Niederauer Laydner.

      Padrinhos do noivo: Antonio Alves Ramos, empresário da construção de ferrovias, e sua esposa Etelvina Brenner Ramos, irmã de Ildefonso. Padrinhos de Lydia: seu cunhado Oscar Hasslocher Haensel (com um "s"), 39 anos, comerciante em Porto Alegre, casado com Anna Julia, irmã de Lydia.  Oscar era filho do deputado Friedrich Haensel, executado pela polícia castilhista, em 1.11.1892, no preâmbulo da Revolução Federalista; Julio Laydner, três anos mais velho, era o irmão com quem ela tinha mais afinidade; e Henrique Grave, seu sobrinho, filho do médico alemão Heinrich Alfred Julius Grave e de Sofia, irmã da noiva, 19 mais velha.

      Cristal Baccarat

      São chamados de cristais os vidros de elevada transparência e qualidade. A história dos cristais Baccarat começou em 1775, na pequena cidade desse nome, na região de Lorena, nordeste da França. Naquele ano, o rei Luiz XV determinou o estabelecimento de uma vidraria batizada de Verreries Sainte-Anne.

      Baccarat, destacada em amarelo, fica a meio caminho entre Nancy e Strasbourg.

      Diz a lenda que todos os dias Luiz XV tomava vinho em uma taça de cristal Baccarat e depois a quebrava para que ninguém mais a usasse. Graças à sua história ligada à monarquia francesa e à fabricação de artigos de luxo, em cristal, a Baccarat produziu peças para vários reis da França, terminando com os últimos monarcas Luiz XVIII, Carlos X e Luiz Felipe. Muitas famílias afortunadas e empresas de luxo passaram a desejar o cristal que a realeza tanto apreciava. A marca ganhou força na decoração e no segmento de mesa, na Europa e no mundo.

      Antiga foto da Cristallerie Baccarat em 1933, mostrando a saída de operários

      A vidraria tornou-se uma Cristallerie - manufatura de de artigos de cristal - em 1816, quando Aimé-Gabriel d'Artigues, empresário do ramo na Bélgica, assumiu os negócios da antiga fábrica. Desde então, a marca é sinônimo universal de lapidação precisa e manufatura de objetos únicos, nas mais variadas formas: vasos, cinzeiros, lustres, candelabros, joias, bijuterias, frascos de perfume, acessórios femininos etc.  Para reis e plebeus abastados, Baccarat é status de opulência, charme e sofisticação real. As peças são lapidadas à mão como pedras preciosas, em processo artesanal com capricho e requinte.

      No Brasil existe o terceiro maior acervo de cristais Baccarat, ficando atrás somente da França e da Alemanha.

      Em 2018, a Baccarat foi comprada por uma companhia chinesa de gestão de investimentos, por 164 milhões de euros.

      Uma dúzia de taças

      O conjunto era de doze peças que nunca foram usadas por meus avós nem por meus pais. Há décadas, reformei um antigo guarda-roupa, substituindo sua pesada porta única por duas portas e instalando prateleiras internas onde as taças Baccarat foram guardadas. Em pouco tempo, o mau serviço do marceneiro provocou a queda da prateleira, quando duas taças quebraram. Restaram as dez apresentadas na foto do início desta postagem.

      Valor

      Na Vinhati Antiguidades, Bairro Floresta, em Porto Alegre, cada taça Baccarat custa R$500,00.


      __________________________________________ 

       Fontes: 

      •  Arquivo pessoal - 
      • Hemeroteca da Casa de Memória Edmundo Cardoso -
      • https://www.viamichelin.fr/- 
      • https://www.geneanet.org/cartes-postales/view/5401140#0 - 
      • https://aresdomundo.com/cristais-baccarat/ - https://en.wikipedia.org/wiki/Baccarat_(company)

      sábado, 1 de maio de 2021

      ADOLPH VON WALLWITZ – Um conde alemão em Santa Maria

       

      Adolph Esche Graf von Wallwitz nasceu em 15 de janeiro de 1848, em Dresden, filho do Conde Georg von Wallwitz e Maria von Kis-Serény.  (cfme CEGENS - Centro de Estudos Genealógicos do Vale do Rio Pardo)

      Brasão dos Condes von Kis-Serény
      desde 1656

      Dresden era então a capital do Reino da Saxônia (em alemão Königreich Sachsen), existente de 1806 a 1918, membro independente das confederações pós-Guerras Napoleônicas. Com a unificação da Alemanha, em 1871, tornou-se parte do Império Alemão. Em 1918, após a Primeira Guerra Mundial e abdicação do Rei Friedrich August III, a Saxônia tornou-se um Estado Livre da República de Weimar, continuando Dresden como capital.

      Situada às margens do Rio Elba, Dresden era chamada "a Florença do Elba" devido à harmonia de sua beleza natural com sua belíssima Arquitetura, intensa vida cultural e artística. Em 1945, nos últimos meses da 2ª Guerra Mundial, a cidade, que não tinha alvos militares, foi quase toda destruída por bombardeios dos aliados, causando uma chacina na população civil. Uma clara intenção de destruir uma das mais belas cidades alemãs.

       

      Dresden - das Florenz an der Elbe

      Santa Maria

      Von Wallwitz emigrou para o Brasil e, em 1873, estava estabelecido em Santa Maria com uma escola na Praça da Constituição, que em 1889 passou a se denominar Praça da República.[1] Instalou a escola no salão da antiga bailanta do alemão Miguel Lau.

      João Daudt Filho foi aluno no Colégio Wallwitz. Nascido em Santa Maria, em 1858, ele tinha 15 anos em 1873, quando von Wallwitz chegou à vila e abriu sua escola. Em suas Memórias,[2] Daudt Filho conta que o professor, com cerca de 25 anos, trajava com elegância, tinha "finas maneiras e um bonito rosto de pele rosada, marcado por um extenso gilvaz recente." Referia-se a uma cicatriz que supunha ser consequente de um duelo. Daudt prossegue, contando que alemães e descendentes matriculavam seus filhos no Colégio Wallwitz, mas que também muitos alunos de famílias brasileiras ali estudavam para aprenderem alemão. O colégio chegou a ter 132 alunos.

      Durante as aulas, Adolph von Wallwitz fumava um enorme cachimbo, segundo o autor, de "quase um metro", sotando baforadas de fumaça em forma de círculo, o que os alunos depois procuravam imitar, sem sucesso. Além do currículo básico, o professor alemão ensinava desenho, ginástica e canto. Daudt lembra: "No fim das aulas, cantávamos alegres Lieder[3]  alemães, e assim os alunos iam se familiarizando com a língua."


      Tipo de cachimbo
      supostamente usado
      por von Wallwitz
      .

      Em sua narrativa, João Daudt Filho acrescenta: 

      Vestido de caçador, botas amarelas, culote [4] de veludo verde, jaquetão cingido por largo cinturão com fivela de prata, chapéu enfeitado com plumas, trompa a tiracolo, espingarda às costas, com a Diana, perdigueira de raça ao lado, rumava em direção aos campos, à cata de perdigões.

       Naquela época, os caçadores não precisavam se afastar muito da pequena vila santa-mariense. Bastava uma caminhada para além dos limites urbanos a sudoeste, então um pouco adiante de onde hoje fica a Rua Visc. de Pelotas, para chegar às pradarias onde havia muitas perdizes e perdigões.

      Adolfo de Walhail ? - A Comunidade Evangélica Alemã (die Deutsche Evangelische Gemeinde)

      O registro de sua história, desde a fundação, em 1866, até a década de 1940, tornou-se uma tarefa difícil devido à destruição das fontes primárias. Todos os assentamentos, arquivos, biblioteca e demais pertences da Igreja Luterana local foram destruídos e queimados, durante os ataques sofridos em 19 de agosto de 1942, instigados pelos movimentos antigermânicos, na época da Segunda Grande Guerra. Na criminosa destruição, foram reduzidos a cinzas, 76 anos de história da Comunidade Evangélica Alemã de Santa Maria e também da cidade, pois muitos de seus membros eram pessoas proeminentes na sociedade local. Entretanto, muitos registros de nascimentos e casamentos foram recuperados graças ao registro civil que fora criado para os acatólicos, em 1863.

      Registro Civil

      Muitas décadas antes da República, D. Pedro II decretou a regulamentação do registro civil, em 17.4.1863, para regularizar a condição social dos acatólicos, isto é, dos imigrantes alemães evangélicos e de seus descendentes. O catolicismo era a religião do Estado e somente seus registros eram reconhecidos. O Decreto do Imperador regulava oregistro dos casamentos, nascimentos e óbitos das pessoas que professavam religião diferente da do Estado”. O 1º capítulo tratava “dos casamentos de pessoas não católicas a quem eram extensivos os efeitos civis dos casamentos católicos.”

      Estabelecia as condições para que “pastores das religiões toleradas” pudessem praticar atos de seu ministério religioso, “suscetíveis de produzir efeitos civis.” Para isso, as atas de eleição ou nomeação dos pastores deviam ser registradas na Secretaria do Governo da Província, em Porto Alegre, mediante sua transcrição em livro específico. Atendida essa exigência legal, os casamentos, nascimentos e óbitos de acatólicos, se os interessados desejassem, podiam ser registrados em três livros, com a transcrição de certidão emitida pelo Pastor: Casamentos a cargo do Secretário da Câmara Municipal. Nascimentos e óbitos, a cargo do Escrivão do Juizado de Paz.

      Em minhas pesquisas no Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, encontrei o valioso documento

      SECRETARIA DO GOVERNO DA PROVINCIA

      LIVRO DE REGISTROS DE PASTORES DAS RELIGIÕES TOLERADAS

      Na fl. 14 verso, a transcrição da ata de “Eleição de Erdmann Wolfram para Pastor Protestante da Communidade Evangelica da Villa de Santa Maria da Boca do Monte” tem o seguinte encerramento:

      Santa  Maria  3  de Junho de 1873     Em nome da mesa: o Secretario Adolfo de Walhail – O Presidente Otto Brinckmann    Os mesarios Henrique Druck,  Carlos Müller,  Pedro  Brenner,  Nicolaus Ehlers, Abraham Kassel, Jacob Winck.

      Os membros mais instruídos da Comunidade eram escolhidos para secretários da diretoria. Essa circunstância e a presença de von Wallwitz em Santa Maria indicam que o secretário de 1873, der Schriftführer, deveria ser Adolph von Wallwitz e não um inverossímil Adolfo de Walhail. Os sobrenomes Walheil ou Wahlheil existem, mas não os encontrei em minhas pesquisas sobre imigração alemã na região de Santa Maria.

      A ata transcrita no citado livro foi assinada pelo secretário, certamente na antiga grafia alemã – die alte deutsche Schrift. Von Wallwitz poderia ter adotado o aportuguesamento de seu nome, inclusive a troca da preposição alemã “von” pela portuguesa “de”.

      Apresento abaixo o nome Wallwitz escrito em duas formas, na antiga grafia cursiva alemã.

      O 2º Oficial da Secretaria do Governo da Província, Antonio José Lavra Pinto, encarregado da transcrição no citado livro, desconhecedor da paleografia alemã, fez uma errada leitura da assinatura de von Wallwitz. A sequência de letras “lwit” poderiam facilmente ser lidas como “hail”. O problema é o “z” final, a menos que fosse interpretado como um traçado finalizador da assinatura de von Wallwitz

      Placa Memorial

      Em Os primórdios da Comunidade Evangélica Alemã de Santa Maria (IHG-S.Maria, 1999), comprovei de forma circunstanciada e documentada que uma placa de bronze, afixada no adro do templo, desde 1973, continha erros, entre eles – o mais grave – a troca do nome de um dos dirigentes fundadores, Philipp Schirmer, por um inexistente Philipp Ilmann. Em consequência, fui convidado, em 2001, a uma reunião da diretoria da Comunidade Evangélica de Confissão Luterana de Santa Maria, quando sugeri que a placa fosse substituída. Integrei então uma comissão também composta pelo Pastor e alguns membros da Comunidade que aprovou meu projeto de duas placas, uma em memória da fundação da Comunidade, em 1866, e outra em memória da construção do templo, em 1873. Para o conteúdo dessa última, apresentei à comissão os indicativos de que o secretário deveria ser Adolph von Wallwitz, o que foi aprovado.

      As placas de bronze, medindo 43 x 70 cm cada uma, afixadas nos pilares internos que sustentam a torre da igreja, foram inauguradas em 5 de abril de 2009, domingo, após o culto memorial dos 143 anos da fundação da Deutsche Evangelische Gemeinde – a Comunidade Evangélica Alemã de Santa Maria

      Maçonaria

      No ano seguinte à sua chegada a Santa Maria, Adolph von Wallwitz participou da fundação da Loja Maçônica Boca do Monte, em 29.11.1874. Eram 54 fundadores, 25 dos quais alemães e descendentes, alguns já iniciados nessa confraria, em outros locais. Vinte anos depois, o nome, que era apenas uma referência geográfica, foi trocado para Loja Maçônica Paz e Trabalho, portando um conteúdo programático, denominação que mantém até hoje

      Santa Cruz

      Em 1878, Adolph von Wallwitz habilitou-se como agrimensor e mudou-se para Santa Cruz. Em 6 de fevereiro de 1884, casou-se em Faxinal, Santa Cruz, com Mercedes Ottilie Textor, nascida em 2 de junho de 1863, na Costa da Serra, filha de Carl Textor e Seferina de Oliveira. Costa da Serra é a denominação antiga da região de Trombudo, hoje Vale do Sol, Candelária, Cerro  Branco e arredores.

      Von Wallwitz faleceu com apenas 39 anos, em 4 de setembro de 1887, em Faxinal, Santa Cruz, supostamente o atual Bairro Faxinal Velho, a 3 km ao sul da Praça Getúlio Vargas, no centro.



      [1] Em 1963, foi rebatizada para Praça Ten. João Pedro Menna Barreto. É popularmente conhecida como. “Praça dos Bombeiros”. Talvez o único caso, no país, em que a denominação de um logradouro que evocava importante evento da história foi trocado pelo nome de uma pessoa.

      [2] Memórias/João Daudt Filho – 4ª ed., S. Maria Ed. UFSM, 2003.

      [3] Lieder, plural de Lied, significa canção, um tipo peculiar de canção característico da cultura germânica.  

      [4] Culote - Calça larga na parte superior e justa a partir do joelho, usada por militares e para montaria, em geral com botas de cano alto ou com perneiras.

      quinta-feira, 18 de março de 2021

      CAPITÃO OTTO BRINCKMANN — local e datas

          Carl Ferdinand Otto Brinckmann veio ao Brasil, em 1851, como capitão de Artilharia da chamada Legião Alemã, contratada pelo Governo Imperial do Brasil para a Guerra contra Oribe e Rosas. Um Brummer, como eram chamados aqueles militares.

      Imagem obtida a partir de foto publicada na Revista Commemorativa do Centenário de Santa Maria, 1914.

            Após o conflito, com 30 anos de idade, ele estabeleceu-se em Santa Maria, em 1855, onde passou a atuar como agrimensor, praticando seus conhecimentos de topografia, ciência usada em Artilharia, na técnica de tiro. Foi o agrimensor da Intendência Municipal até se aposentar, em 1898.

          O Capitão Otto Brinckmann, como sempre foi chamado, construiu sua casa na Rua do Comércio, onde hoje está o Edifício Block, nº 1058, na Segunda Quadra da Rua Doutor Bozano. No final do século XIX, funcionava em parte da casa, ou no prédio ao lado, nº 66, a redação e oficina tipográfica de O Combatente, jornal de Candido Brinckmann, filho de Otto. Os últimos moradores do casarão foram os membros da família do Dr. Lamartine Souza, neto de Otto. O Dr. Lamartine tinha ali sua residência e seu consultório médico. O terreno se estendia até a Rua Venâncio Aires, onde havia um portão para entrada de carro.

      Ao centro, com 11 aberturas, a casa de Otto Brinckmann, na 2ª Quadra da Rua Dr. Bozano. Foto de Bortolo Achutti, 1940.
           Otto Brinckmann exerceu forte liderança na etnia alemã santa-mariense. Foi presidente da Deutsche Evangelische Gemeinde – a Comunidade Evangélica Alemã de Santa Maria, em 1873, quando foi construído o templo. Certamente estava entre os fundadores da Comunidade, em 8.4.1866.

          Em 28 de outubro de 1866, o Cap. Otto Brinckmann reuniu em sua residência 18 alemães e descendentes para fundarem o Deutscher Hilfsverein de Santa Maria, sendo seu primeiro presidente. De início uma sociedade beneficente, passou por mudanças nas denominações e nos objetivos, tornando-se a atual Sociedade Concórdia Caça e Pesca-Socepe, que em outubro vindouro completará 155 anos de fundação.

           Datas

          Em 22.5.2016, fiz uma postagem, neste blog, sobre esse insigne personagem, comentando que ele
      nascera “em 21.5.1826, em local não identificado da atual Alemanha”. A citada data do nascimento é a que consta na lápide de seu túmulo, no Cemitério Municipal de Santa Maria.

          Entretanto, o necrológio publicado quatro dias após seu falecimento, em O Combatente, edição de 8.1.1903, 1ª p., registra que Otto falecera “contando 78 anos e meio de idade”, o que remete a data do nascimento para meados de 1824. Isso é condizente com as informações do site genealógico Geni, que registra a data do nascimento em 21.5.1824. O teor do necrológio é confiável, pois o proprietário e diretor de O Combatente era Candido Brinckmann, filho mais velho de Otto.

      Acervo Casa de Memória Edmundo Cardoso.
          No site genealógico Geni consta que Carl Ferdinand Otto Brinckmann nasceu em 21.5.1824 – mesmo dia e mesmo mês citados na lápide, com dois anos de diferença. Geni (www.geni.com) é um site norte-americano de genealogia, com sede em Los Angeles, de propriedade da empresa privada israelense MyHeritage.

          O site também informa que Otto faleceu no Brasil, era filho de Johann August Brinckmann e de Dorina Brinckmann, e teve um filho chamado August.


          No Registro Civil de Óbitos (2, 162, 3 - 1ª – 1903), consta que ele era natural da Alemanha, faleceu em 04.01.1903 em Santa Maria, RS, com 78 anos, filho de Augusto Brinckmann e Margarida Brinckmann.

          Otto Brinckmann casou com Maria Basilia Garcia da Rosa com quem teve, pelo menos, cinco filhos, um deles chamado Augusto:

          Candido, 1869; Adolpho Otto, 1872; Vicentina, 1874; Octilia, 1876 ; Porfiria (Fifi), 1878; Augusto, ~1886;. A menina Octilia morreu com um ano de idade.

          O nome do pai é confirmado, mas há divergência quanto à mãe: no registro, Margarida e no site, Dorina, um prenome bem raro na Alemanha.

          Local - Magdeburg

          No citado site consta que o Cap. Brinckmann nasceu em Magdeburg, atualmente capital do Estado Federal de Saxônia-Anhalt, na Alemanha. Citada em documentos desde o ano de 805, Magdeburg é uma das mais antigas cidades da Alemanha, Otto I, o Grande, imperador do Sacro Império Romano-Germânico, tornou Magdeburg, em 950, um Arcebispado e uma das mais importantes cidades e sei império. Por isso Magdeburg é camada Die Ottostadt -  "A Cidade de Otto", uma possível influência na escolha de um dos prenomes de Brinckmann, pelo qual ele ficou conhecido. Na época de seu nascimento, sua cidade natal pertencia ao Reino da Prússia. Em 1815, após o fim das Guerras Napoleônicas, o território do Ducado de Magdeburg foi um dos que formaram a nova Província Prussiana da Saxônia, cuja capital era a cidade de Magdeburg.

      A região histórica da Província da Saxônia hoje compreende a maior parte do atual estado federal alemão da Saxônia-Anhalt. . 

      Fontes:
      Arquivo pessoal
      Pesq. no Reg. Civil S. Maria por João Alberto Licht Teixeira
      O Combatente - Casa de Memória Edmundo Cardoso
      Cemitéro Mun. de S. Maria
      http´s://geni.com
      wikipedia.org-Saxônia-Anhalt