Este dia 18 de julho de 2017
marca o centenário do Avenida Tênis Clube, fundado por um grupo de moças
santa-marienses, várias delas recém-saídas do internato em colégios de Porto
Alegre.
Em uma reunião das jovens amigas,
em janeiro de 1917, no palacete residencial do médico Astrogildo de Azevedo, intendente municipal
e pai de uma delas, Aracy Pinto de Azevedo, elas planejavam sobre o que fazer
na pequena Santa Maria de cerca de 15.000 habitantes. Haviam terminado os
estudos e não mais voltariam aos colégios da capital.
Foi então que uma das jovens, Stellita
Mariense de Campos, teve uma ideia que foi aceita com entusiasmo: Construir uma
quadra de tênis, pois esse esporte era praticado por mulheres e a quadra era um
espaço de convívio social com os rapazes.
Durante o tempo de internato, no
Colégio Bom Conselho, em Porto Alegre, havia passeios periódicos, pelo bairro
Moinhos de Ventos, austeramente guiados pelas irmãs. Elas lembravam de terem
visto, então, quadras de tênis, em algumas residências, onde jovens de ambos os
sexos jogavam alegremente. Além disso, houvera em Santa Maria o Lawn-Tennis Club, com quadra na Av. Rio
Branco, de curta duração, fundado por engenheiros e dirigentes da Viação
Férrea.
As jovens obtiveram o empréstimo
de dois terrenos contíguos, na Av. Rio Branco, para a construção da quadra. Um
deles pertencia ao eng. Gustave Clarles Vauthier, diretor da Viação Férrea, e o
outro ao eng. Eduardo Sabóia, empreiteiro da ferrovia. Talvez fosse o mesmo local
da quadra do extinto Lawn-Tennis Club. Elas
compraram a rede, raquetes e bolas que haviam pertencido a esse clube, então existentes
no armazém da Cooperativa dos Empregados da Viação Férrea, guardadas por seu
gerente, Manoel Ribas.
A fundação e as fundadoras
No
dia 18 de julho de 1917, uma quarta-feira, talvez à tarde, na mesma residência, foi eleita a primeira
diretoria da então denominada Sociedade
Sportiva Avenida Tennis Club: presidente:
Stellita Mariense de Campos, vice-presidente: Aracy Pinto de Azevedo; 1ª
secretária: Docelina de Arruda Gomes, 2ª secretária: Dorvalina Gomes da Costa,
tesoureira: Odette Appel Lenz. Estavam também presentes Georgina Brenner, Maria
Becker Pinto e Violeta de Arruda Gomes. Na sessão seguinte, seis dias
depois, em 24 de julho, estava presente Zilda Morsbach Haeffner. A ata dessa
sessão não a cita como uma nova sócia, então devemos incluí-la no grupo de nove
fundadoras que tinham entre 15 e 18 anos, no mês da reunião primordial, quando
a construção da quadra foi decidida.
Esse número pode ser revisto, em
razão de um texto escrito por Aracy Azevedo. Referindo-se às despesas com a
compra da rede, raquetes e bolas, que ocorreu antes da assembleia, ela diz ter
contado “com a solidariedade das colegas de ontem no Colégio Bom Conselho:
Violeta e Docelina Gomes, Dorvalina Costa, Georgina Brenner, Abrilina Pinto de
Araújo, Iracema, Innocencia e Inah Simões Pires, Maria Oliveira, Aracy Paz,
Emilia Pereira etc.” As três primeiras já citadas como fundadoras, mas se essas
últimas sete jovens participaram do pagamento da rede etc. não seriam também
fundadoras? E quem seriam as outras mais referidas por Aracy como “etc.”?
As fundadoras e suas
idades em janeiro de 1917
Aracy Pinto de
Azevedo – 17 anos. Nasceu em
Santa Maria , em 15 de julho de 1899, filha do Dr. Astrogildo
Cesar de Azevedo e Aura Pinto de Azevedo.
Seu pai era médico formado pela Faculdade de Medicina do Rio
de Janeiro. Liderou a fundação do Hospital de Caridade, inaugurado em 1903, e o
dirigiu por 24 anos. Na época da fundação do Avenida Tênis Clube, ele era o
chefe político do Partido Republicano e fora eleito Intendente Municipal, em
agosto de 1916.
Aracy Pinto de Azevedo |
Aracy estudou como interna no Colégio Nossa Senhora do Bom
Conselho, em Porto Alegre ,
até dezembro de 1916.
Embora tenha assumido a liderança nos primeiros passos do
clube, e a primeira assembléia tenha se realizado em sua casa, Aracy foi eleita
vice-presidente, na primeira diretoria. Segundo a história oral, ela quis dar a
primazia da presidência à autora da ideia.
Em 16.9.1918, Aracy foi eleita presidente do
Avenida Tênis Clube e, em 1º de maio de
1920, foi-lhe concedido, conforme a ata, “um
título honorífico pelos esforços empregados desde a fundação do club”,
definido depois como Presidente Honorária.
Em 22 de janeiro de 1931, ela casou com
Frederico Guilherme Klumb, então 1º tenente do Exército, passando a chamar-se
Aracy de Azevedo Klumb. Aracy faleceu em Santa Maria, em 18.5.1987, com 87 anos, deixando extensa e importante descendência.
Stellita Mariense de
Campos – 17 anos. Nasceu em 6 de setembro de 1899, em Santa Maria , onde sua
mãe se encontrava.
Filha de Antero Mariense de Campos e de Lourença Pereira de
Campos (Sinhá), fazendeiros em Estrella, município de Júlio de Castilhos, então
chamado Villa Rica.
Foi também interna no Colégio Bom Conselho,cujo curso concluiu
junto com Aracy.
Stellita em tela de Eduardo Trevisan |
Em 1º.10.1919, Stellita casou com o advogado J. Ignacio
Silveira de Campos, com 25 anos, nascido em Porto Alegre e Intendente Municipal
de Júlio de Castilhos. O ato religioso foi celebrado na Catedral, pelo Padre
Caetano Pagliuca, tendo Aracy Azevedo como madrinha. O ato civil foi realizado
na residência da noiva, na Rua Coronel Niederauer, 139, em Santa Maria. Após
o casamento, o casal seguiu para Júlio de Castilhos, afastando-se, assim,
Stellita do A.T.C.
Foi a primeira presidente do Avenida Tênis Clube.
Docelina de Arruda
Gomes – 16 anos. Nasceu em
Santa Maria , em 8 de março de 1900, filha de Jeronymo da
Costa Gomes e Brígida de Arruda Gomes. O pai era coronel comandante da Brigada
de Cavalaria da Guarda Nacional, em Santa Maria , criada em agosto do 1915. Fora o
anterior Intendente e era co-proprietário da filial local da Livraria do Globo.
Docelina de Arruda Gomes |
Docelina estudou no Bom Conselho, como interna, junto com
Aracy e Stellita.
Foi a secretária da primeira diretoria.
Casou com José Xavier da Rocha. Faleceu em Santa Maria , em
8.9.1992, com 92 anos. Naquele ano, em sua homenagem, como única fundadora
viva, foi instituída a Copa Docelina, que de tornou importante evento
internacional de tênis.
Violeta de Arruda
Gomes – 18 anos. Nasceu em
Santa Maria , em 16 de outubro de 1898. Era irmã de Docelina. Também foi aluna interna no Colégio Bom Conselho.
Casou com Waldemar Moreira, fiscal da Fazenda Nacional. Seu
filho Luiz Pompílio Gomes da Rocha Moreira, general do exército.
Georgina Pereira
Brenner – 16 anos. Nasceu em
Santa Maria , em 20 de agosto de1900, filha do comerciante Julio
Brenner e de Brisabel Pereira Brenner.
Em 5.6.1919, casou com o advogado Mario Gomes de Oliveira
Guimarães, nascido em 9.8.1892, em Belmonte, no litoral da Bahia. Ele exercia o
cargo de promotor público, em Santa Maria, e foi aclamado orador oficial do
Avenida Tênis Clube, na assembleia de 26.9.1917. O casamento foi celebrado na residência
dos pais da noiva, na Rua Ipiranga, hoje Av. Presidente Vargas, citada no
jornal da época como o palacete de Julio
Brenner.
Odette Appel Lenz
– 18 anos. Nasceu em
Santa Maria , em 20 de fevereiro de 1898, filha de João
Odette Appel Lenz |
Neta de Johann Peter Lenz, alemão, e Carlota Lenz; e de
Antonio Appel, alemão, e Carlota Appel.
João Lenz era vice-intendente na gestão do Dr. Astrogildo de
Azevedo (1917-18).
Odette era a tesoureira da primeira diretoria e foi eleita
presidente do A.T.C., em 14.3.1920, sucedendo Aracy Azevedo.
Dorvalina Gomes da
Costa – 18 anos. Nasceu em Tupanciretã, em 5 de junho de 1898, filha de Júlio
Marques da Costa e Rita Gomes da Costa.
Era a segunda secretária da primeira diretoria.
Em 7.3.1925, casou com o comerciante Ernesto Antão Teixeira,
nascido em Porto Alegre ,
em 17.1.1894. O casamento foi celebrado
na residência da noiva, na Rua Floriano Peixoto, nº. 68.
Maria Becker Pinto ~14 ou 15 anos.
Nasceu em Santa Maria, em 19 de maio em 1901 ou 1902, filha do médico Nicolau Becker Pinto e Docelina Weinmann Pinto. Era neta do Dr. Pantaleão José Pinto, primeiro santa-mariense que se formou em Medicina, e de Anna Maria Becker Pinto. Casou, em cerca de 1928, com o economista carioca Henrique Aranha Lowndes e mudou-se para o Rio de Janeiro.
Zilda Morsbach Haeffner – 18 anos. Nasceu em Santa Maria , em 20 de novembro de 1898, filha de Aristides Gabriel Haeffner e Augusta Morsbach Haeffner.
Casou, em 15.12.1923, com Olívio Kroeff, comerciante de 47 anos, filho de Miguel Kroeff e Anna Kroeff. Zilda Haeffner Kroeff faleceu em Santa Maria , em 18.6.1978, com 79 anos.
A Falsa data
O primeiro registro documental do clube é a ata da assembleia de
18 de julho de 1917, quando foi eleita a primeira diretoria. Antes disso, houve
ações já citadas, mas nenhuma assembleia de fundação. Nem mesmo na redação da
ata de 18 de julho, as jovens e inexperientes fundadoras registraram que estavam
fundando um clube, mas esse registro deve ser reconhecido como o de fundação do
Avenida Tênis Clube.
Durante cerca de oito décadas, o clube festejou seu
aniversário referido a 7 de setembro de 1916, mas isso se deve a uma confusão provocada
pelas dirigentes dos primeiros tempos e a outros fatos. Elas comemoravam a inauguração da quadra de
tênis como sendo o aniversário do clube.
Nada ocorreu em 1916, quando várias fundadoras ainda estavam
no internato, em colégios de Porto Alegre, e somente em dezembro daquele ano,
terminados os estudos, voltariam a Santa Maria. Alguns indícios me causavam
dúvidas sobre a falsa data até que na festa do falso 85º aniversário, em
setembro de 2001, Marina Klumb Dalasta, fiha de Aracy de Azevedo Klumb me disse
que sua “mãe não poderia ter fundado o tênis em 1916, pois era aluna interna no
Colégio Bom Conselho, em Porto Alegre.”
Minhas dúvidas se tornaram então certeza, e iniciei uma
cuidadosa pesquisa para reunir provas a respeito.
A data verdadeira
2004 na sede do ATC - Apresentação de José Antonio Brenner ref. à data da fundação. |
A diretoria do presidente Renato Junker Machado acolheu o
resultado de minha pesquisa e sugestão de que fosse reconhecida como data de
fundação a da primeira assembleia, em 18.7.1917.
Em 2004, na comemoração dos 87 anos do A.T.C., perante cerca
de 500 associados, fiz a apresentação com irrefutável documentação provando que
todas as ações para a criação do clube ocorreram em 2017.
Locais da sede e desenvolvimento
A primeira quadra de tênis do Avenida
Tênis Clube foi construída na Avenida Rio Branco localização que foi escolhida
para denominação do clube.
Depois, em 1920, teve duas
quadras na Praça da República. Três anos depois, em 1923, inaugurou sua melhor
sede até então, na Praça do Mercado, atual Saturnino de Brito, com três quadras
e pavilhão social. Em 1930, transferiu-se novamente para a Praça da República, na área hoje ocupada pelo Corpo de
Bombeiros. Durante 27 anos, o A.T.C. ficou naquele local, com muitas
glórias, a mais importante conquistada por sua atleta Carmen Paz, com três títulos
nacionais: campeã brasileira por equipe e bicampeã brasileira individual de tênis,
em 1950 e 1953.
Em 25.4.1920, o clube inaugurou
sua nova instalação na Praça da República, onde teve duas quadras e permaneceu
por três anos e oito meses. Em 15.12.1923,
inaugurou nova sede, na Praça do Mercado, atual Saturnino de Brito, com três
quadras e seu primeiro pavilhão social. Sete anos depois, em 1930, voltou à Praça
da República
Durante os anos de 1957 e 58
transferiu-se para o local onde se encontra, em área doada pelo Município, onde
o A.T.C. começou seu desenvolvimento em âmbito social e esportivo que se tornou
notável após a aquisição da nova área, do outro lado da avenida, em 1986, na
gestão do presidente Roberto Bisogno. A prestação de serviços aos associados
foi consideravelmente ampliada, com a do Centro Poliesportivo, com piscina
térmica semiolímpica e novas saunas, construído na gestão do presidente Leomyr de
Castro Girondi (2009-2013). Isso possibilitou, depois de 45 anos, a reorganização
da equipe de natação que, nos anos 1960-1970, tantos títulos conquistou.
A sociedade santa-mariense e os ateceanos,
com muito orgulho, devem comemorar o centenário do A.T.C., de tanta importância
no contexto histórico da cidade e do estado, ao longo de sua rica existência de
valiosos fatos, feitos, personagens e conquistas. Um clube que começou há 100
anos com uma quadra de tênis, na Avenida Rio Branco, e hoje, entre vários
outros setores sociais e esportivos, conta com 12 quadras, em outra avenida,
que deveria receber a denominação de Avenida Tênis Clube.