sábado, 21 de junho de 2014

O hino do Avenida Tênis Clube

No ano de 1933, fatos importantes ocorreram no Avenida Tênis Clube. Houve a eleição da primeira rainha, foi composto o hino, realizado um festival beneficente e lançado o A.T.C., o primeiro jornal do clube. Na metade do ano, meu pai, Ennio Brenner, tornou-se campeão.

    O Avenida Tênis Clube teve seu primeiro e único hino, composto em 1933, com música de Horst Walter Puhlmann e letra de Lamartine Souza.
    O médico Lamartine Souza, campeão do clube, desde 1920, era então vice-presidente e atuava, desde 1922, na Diretoria Executiva e no Conselho Fiscal. Era homem de vasta formação cultural, especialmente no âmbito da literatura.
Horst Walter Puhlmann
    Horst Puhlmann nasceu em Santa Maria, em 1912, filho de Alfredo Puhlmann, natural de Santa Cruz e aqui estabelecido, desde 1911, após formar-se em odontologia, em Berlim.
    Horst começou a jogar tênis, em meados de 1930,  no Santa Maria Tênis Clube, na Rua Silva Jardim, entre as ruas Serafim Vallandro e Duque de Caxias. Esse clube surgiu de uma dissidência no Avenida Tênis Clube, que levou um importante grupo de sócios a se demitirem e fundarem a nova associação, em 9.11.1929. Entre eles, Mimi Philbert, vice-presidente, Ginette Turi, principal tenista, e Aracy Azevedo, uma das fundadoras e ex-presidente do A.T.C.
Dr. Lamartine Souza,
autor da letra.
    Na época, o A.T.C. teve suas atividades esportivas suspensas por mais de um ano, com a desocupação da Praça do Mercado (Saturnino de Brito), imposta pela Intendência Municipal, devido às obras de saneamento básico. Em 21.6.1931, inaugurou novas instalações na Praça da República, com três quadras, onde o jogo voltou a ser intensamente praticado.
    Três meses depois, em 20.9.1931, o Avenida Tênis Clube recebeu em sua sede o Santa Maria Tênis Clube, para um torneio, uma iniciativa do clube anfitrião para estabelecer boas relações com o coirmão local.
    O jovem Horst Puhlmann, com 19 anos, era o principal tenista do clube visitante e foi a maior revelação do torneio. Jogou contra Ennio Brenner, 24, então vice-campeão do A.T.C., perdendo por 6x1, 3x6 e 6x1.
Referindo-se ao torneio, o Diario do Interior, em 29.9.1931, destacou o desempenho de Horst.
    Desejando ingressar no A.T.C. e sendo proposto para associar-se, Horst já jogava nas quadras do clube em agosto de 1932, sendo admitido como sócio, na sessão de diretoria, em 3.9.1932.
 
Sob o pseudônimo de Drive, o cronista do tênis comemorou a aquisição de Horst, no Diario do Interior, em 11.8.1932.
    Horst Puhlmann, contabilista de profissão, era um habilidoso pianista. Não tinha conhecimentos teóricos de música, mas com uma reconhecida aptidão natural, "tocava de ouvido", com muito talento. Na mesma época em que ele se tornou sócio do A.T.C., o clube adquiriu um piano no qual Horst revelava suas habilidades musicais, animando as frequentes reuniões realizadas no pavilhão social. Em 1933, o entusiasmo geral para a realização do festival artístico em beneficio do clube, quando seria coroada sua rainha, animou o jovem músico a compor o hino do A.T.C.
     Em 19 de maio, sábado, Horst tocou, no piano da sede, o hino que havia composto, sendo muito aplaudido pelo grande número de ateceanos presentes. Foi então anunciado que a letra seria escrita por Lamartine Souza. 
Partitura do Hino do A.T.C., com a observação "incompleto".
    Na edição do Diario do Interior de terça-feira seguinte, o cronista que assinava “Fundo” atribui uma “capacidade prefulgente” a Horst. Comenta que em pouco tempo o “novel compositor escreveu uma linda ‘marcha de guerra’ para o A.T.C.” acreditando que ele se inspirara “no seu próprio estilo tenístico violento, para depois, na defensiva, entrar numa fase mais calma.”
    O cronista revela, a seguir, a importante participação de Herta Puhlmann, irmã de Horst.
Diario do Interior, terça-feira, 23.5.1933, 1ª página.
   Quando encontrei a letra do hino, publicada no Diario do Interior, na edição de 1.7.33, entrei em contato com a Prof.ª Herta, na esperança de que ela tivesse a partitura. Contou-me então que Horst compusera o hino e, como ele não conhecia a técnica, ela escrevera na pauta as notas musicais. Herta Thea Puhlmann era professora de inglês, no Colégio Centenário, onde seria diretora, de 1966 a 1980. Em sua homenagem, o prédio do Colégio Centenário destinado à pré-escola foi denominado, em 1972, “Edifício Herta Puhlmann Chagas. Ela era também apreciada pianista, tendo se apresentado em concertos, na cidade.

    Na edição de 1.7.1933, sábado, o Diario do Interior publicou a letra do hino do A.T.C. que seria "cantado em seu próximo festival, por um grupo de moças da nossa sociedade."
 Que prazer freqüentar o “Avenida”
Pelas tardes bonitas de sol,
Exaltando a alegria da vida,
Num ambiente de elite e de escol.

Há encanto que não se descreve,
Que impressiona, mas que não se diz
Numa frase sutil, fina, breve,
Ou num drive em que se foi feliz.
 Coro:
Lá no “Avenida” tudo é lindo;
Nosso clube é sem rival.
Vamos pra frente, alegres, rindo,
Porque a vitória é sempre do mais jovial.

A raquete é sinal de lealdade,
De nobreza, de ritmo, de tom.
Faz pensar numa felicidade,
Na ventura de ser belo e bom.

Branca e azul é nossa bandeira,
Pavilhão todo cheio de glórias.
Branca e azul, tremulando altaneira,
Com orgulho de nossas vitórias.

Edith Stellfeld  (E) e Herta
Puhlmann, na inauguração
da quadra do Colégio Centenário.

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    Em 1º de setembro de 2002, domingo, Herta me telefonou, informando que achara a partitura. No dia seguinte, eu a visitei em seu apartamento nº 403, no Edificio Pimenta, à Rua Dr. Bozano, 729, levando a letra do hino, escrita por Lamartine Souza. Ela então sentou-se ao piano e tocou o hino do A.T.C. composto por seu irmão, enquanto ambos cantamos a letra. Música e letra se ajustaram na primeira estrofe, mas não na sequência.
    Em 11.9.1935, o Colégio Centenário inaugurou uma quadra de tênis onde Herta Puhlmann também passou a jogar. Entre as tenistas do Centenário estava a aluna interna Edith Stellfeld, de Livramento, com quem Horst Puhlmann casou, em 1940.
    O hino foi apresentado ao público no festival de coroação da rainha e em benefício do Avenida Tênis Clube, no Cine Independência, cantado por um coro de ateceanos, em 4.7.1933.
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Fontes:
Livro nº1 de atas do ATC.
Diario do Interior, S. Maria, hemerotecas do Arquivo Histórico Municipal e da Casa de Memória Edmundo Cardoso.
Acervo José Antonio Brenner.
Acervo família Puhlmann.

domingo, 8 de junho de 2014

Norma Seibel – A 1ª Rainha do Tênis

    Norma nasceu em Santa Maria, em 6 de maio de 1913, filha de Ernesto Seibel e Rosalina Peuckert Seibel. O pai, natural de Santa Cruz do Sul, estabeleceu-se como fabricante de móveis, em Santa Maria, onde casou com a santa-mariense Rosalina Peuckert, filha do comerciante Celestino Peuckert. A residência da família ficava na Rua 7 de Setembro, esquina Borges do Canto.
     Norma estudou em Porto Alegre, como aluna interna, desde os nove anos de idade, na escola feminina alemã Marienschule, dirigida pelas irmãs franciscanas. A Marienschule (Escola Santa Maria), criada em 1914, transformou-se na Escola Nossa Senhora Medianeira, em 1938. Era vinculada à Comunidade da Paróquia São José e situava-se à direita da igreja, na então Rua São Rafael, hoje Av. Alberto Bins, onde está o Centro de Eventos São Rafael.
Norma, aos 14 anos, no pátio da Marienschule.
Ao fundo, a Igreja São José.
    Muito cedo, talvez com seis ou sete anos, Norma iniciou seu aprendizado em violino, em Santa Maria, com professor particular. No internato, em Porto Alegre, ela continuou a praticar o manejo do instrumento e, em 1925, com 11 anos, prestou exame de admissão no Instituto de Bellas Artes do Rio Grande do Sul (atual Instituto de Artes da UFRGS). Foi então classificada para o 3º ano de Violino e 1º ano de Teoria e Solfejo.
    Durante o seu período escolar na Marienschule, ela estudou música, durante sete anos, formando-se em Teoria e Solfejo, em 1927.  Em 1928, concluiu o 6º ano de Violino, aprovada com distinção, grau 10, que lhe valeu um diploma de Menção Honrosa. Após ter prestado exames finais, em 30.11.1931, Norma Seibel concluiu o 2º ano de História da Música e o 9º ano de Violino, sendo “aprovada plenamente com grau 9” conforme consta em seu diploma.

    Em 23.12.1930, foi fundado o Centro de Cultura Artística de Santa Maria-CCA, que 10 dias depois teve aclamada sua diretoria: presidente, Luiz Schmidt Filho; vice-presidente, João Belém (autores da iniciativa); orador, João Bonuma; secretário, Fernando do Ó; tesoureiro, Garibaldi Poggetti. Esse último era diretor do Instituto Musical Araújo Vianna, na Rua Floriano Peixoto esquina Marquês de Maricá,[1] sede do CCA. O objetivo era desenvolver o conhecimento e o apreço pelas artes promovendo reuniões quinzenais com apresentações de música, pintura, escultura e literatura.
     Antes de se formar, Norma já participava de concertos em Santa Maria. Na terceira reunião do CCA, em 11.2.1931, a jovem violinista de 17 anos apresentou-se, segundo o crítico do Diario do Interior, “além da expectativa geral”, executando o programa, “com muita segurança e técnica”.
Já formada, Norma Seibel participou da 12ª sessão de arte do CCA, em março de 1932. Conforme o mesmo jornal, ela mereceu os maiores elogios da platéia, quando “em bela reafirmação de um excepcional talento artístico, sobejamente demonstrado no manejo mágico do arco, executou Rêverie de Schumann e Rapsódia Húngara de Hauser.”[2]
Trechos do texto de Fernando do Ó sobre Norma Seibel, em C.C.A.,
revista do Centro de Cultura Artística, edição de 25.12.1932.

    Notícias do Diario do Interior revelam que algumas reuniões seguintes foram organizadas “com admirável senso artístico por Norma Seibel, talentosa violinista patrícia.” O jornal comenta que na reunião de 25.5.1932, “Norma Seibel, com aquele espírito fino de artista, revelado em outras ocasiões, presidiu, com admirável senso artístico, a distribuição dos números  da noitada de arte. Pena que, por um requinte de modéstia, não quisesse tomar parte [...] Violinista de méritos incontestáveis, a jovem artista patrícia é uma afirmação magnífica de talento realizador.”
Ao violino. Foto publicada em C.C.A. e
em A.T.C., ed. 1.11.1933. Photogr. Koehn.
    Mas na reunião do CCA, em 29.6.32, Norma Seibel executou Romanza de Max Reger, [3] e Zingaresca, de Pablo de Sarasate, na qual esteve admirável. O Diario do Interior destacou a “arcada firme, espírito que sente o trabalho que interpreta, desvendando a alma do compositor nas suas nuanças todas – Norma portou-se como era de se esperar: magistralmente!”
    Quando foi eleita Rainha do Tênis, havia mais de um ano que ela lecionava violino às alunas da Escola de Artes e Ofícios Santa Teresinha,[4] da Cooperativa dos ferroviários.
    Norma foi professora naquela escola feminina, de 15.3.1932 a 1º.3.1936, quando pediu demissão, certamente, em razão do casamento, que seria celebrado três meses depois.
    Casou em 30.5.1936, sábado, com Octavio Silvestre de Oliveira, natural de Coimbra, Portugal, que exercia a direção contábil da citada Cooperativa. O casal teve a filha Maria Thereza, nascida em 7.7.1937.

    Em novembro de 1938, como parte do programa comemorativo dos 25 anos da Cooperativa dos ferroviários, Norma apresentou-se na Associação dos Empregados da Viação Férrea, acompanhada ao piano por sua irmã Ilma Seibel. 

     Norma Seibel de Oliveira faleceu em 28 de maio de 2009, três semanas após completar 96 anos de idade. Deixou quatro netos: Denise da Silveira Seibel Cabral, residente em Curitiba; o médico veterinário Octavio Oliveira da Silveira, o engenheiro civil Joel Silveira Filho, ambos residentes em Santa Maria e tenistas do A.T.C., e Liana Silveira Cassol, residente em Porto Alegre. Liana foi Rainha de Festas do A.T.C., em 1980, ocasião em que Norma recebeu uma placa do clube, alusiva ao primeiro reinado que ela exerceu no A.T.C.

    Norma conservou zelosamente seu violino no qual tocava, em reuniões familiares, acompanhada ao piano por sua filha Maria Thereza.
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Fontes:
Diario do Interior - Hemeroteca do Arquivo Histórico Municipal.
C.C.A. - Hemeroteca da Casa de Memória Edmundo Cardoso.
Acervo pessoal de Octavio Oliveira da Silveira.




[1] Pela Lei nº 1209/65, de 6.9.1965, o Prefeito Francisco Álvares Pereira mudou a denominação para Rua Dr. Astrogildo Cesar de Azevedo.
[2] Michael (Miska) Hauser (ê 1822  Pressburg,  1887  Viena ), virtuose do violino e compositor austro-húngaro .
[3] Romanze para violino e piano, de Max Reger - Johann Baptist Joseph Maximilian Reger (1873-1916) foi um compositor, organista, pianista e maestro alemão.
[4] O edifício hoje abriga o Colégio Estadual Manoel Ribas.